Barulho de vidro quebrando na esquina da rua. Os gritos de
socorro ecoam durante a madrugada. Esses gritos rompem barreiras incríveis: a
distância de dez casas até chegar a minha, o portão da garagem que dá acesso a
rua e minha janela que dá acesso a garagem. No auge do sono as quatro da
madrugada, não pude discernir se era um som real ou apenas o eco de um sonho que nunca mais lembrarei,
tornei a dormir.
Cinco minutos para as seis da manhã. Despertador. Acordei.
Ligo a televisão. Banho. Café. Visto a roupa. Chaves, carteira, celular, tudo
na mochila. Saí de casa.
Uma manhã parcialmente nublada e os vizinhos persistem em
ficam na neblina à beira de seus portões com as cabeças viradas para a esquina,
onde ainda permanecia o aglomerado de guardas desviando o trânsito, outros
verificando algo no chão que até então não percebi o que era até ver o solado
dos pés descalços e pálidos virados para mim que já não andava mais pelo meio
da rua mas já havia mudado para o lado posterior ao amontoado de guardas, eram
pés de alguém e esse alguém não importa agora, pensei. São quinze para as sete.
Atrasado.
Cheguei ao trabalho. Assinei o ponto. Fui ao armário.Abri-o.
O frio que desceu pela minha espinha não há termômetro que
possa medir sua temperatura nem velocímetro a velocidade com que desceu por
minhas pernas as deixaram bambas. Um envelope estava dentro de meu armário. Caro
leitor, é claro que não fui eu que o coloquei lá, então porque acha que iria me
assustar tanto?
Um envelope de papel madeira, fino e com um pequeno relevo
denunciando o que poderia ser o objeto guardado ali dentro. O lacre simples de
abrir, um barbante enrolado numa presilha dizia que ninguém a não ser eu teria acesso a
ele, portanto, não haveria necessidade de lacres mais difíceis. Peguei-o
finalmente, algo leve e mole em seu interior, ao puxar de dentro do armário, um
cartão com gotas vermelhas (só depois percebi que era sangue), as mãos trêmulas
levaram o cartão aos meus olhos míopes que leram:
Continua...